terça-feira, 10 de maio de 2011

Os dias passam iguais, mas o medo não.

Modinhas do medo


Medo I


O medo não aquieta nem deixa dormir, perturba. Todas as noites a mesma ladainha. Fico sasaricando pelos cantos, reviro caixas e gavetas com a esperança de encontrar o sono escondido num buraco qualquer. Mas ele foge - mais do que criança foge de banho.


"Durma medo meu". Canto. Sento, levanto, deito e viro para todos os lados.

Ao longe ouço um barulho. O corpo ferve, coração dispara, pego o telefone, me encolho na cama, fecho os olhos e me imagino numa bolha imaginária.

"Se eles entrarem não vão me ver aqui". O barulho não se repete. Deixo o telefone ao lado do travesseiro, continuo deitada mas já posso dispensar a bolha imaginária. Fecho os olhos tentando arrumar outro alvo para os pensamentos, de preferencia alvos bons...músicas, doces, viagens, planos. Penso em tudo e em todos, ao mesmo tempo em que mantenho os ouvidos bem atentos para qualquer barulho suspeito.

O corpo cansado começa a pesar sobre a cama. Aos poucos todos os sentidos vão se desligando, até que durmo, com medo.


Medo II



Acordo, levanto, me visto rapidamente, escovo os dentes. Saio. Paro em frente ao portão e tento ver a rua. Olho cuidadosamente para os dois lados antes de pegar a chave. Atento os ouvidos para qualquer barulho distinto. Saio. Ando pelas ruas com a bolsa pressionada embaixo do braço e os olhos saltitando atentamente por todos os lados.

O celular toca. Não atendo mas discretamente aperto um botão qualquer para que ele não fique tocando alto. Afinal, ninguém precisa saber que estou carregando um valioso celular.


Medo III



Uma amiga me chama pra sair. O bom e velho encontro no boteco da sexta feira, porque não?!

Arrumo a casa, arrumo as coisas, me arrumo. O tempo passa.

Hora de sair. Está escuro lá fora. O medo me pega de jeito e não se deixa vencer.

Quer saber? Eu nem queria ir mesmo...


Medo IV



Domingo a tarde. Dia de sol e de parque. Dia de amigos e namorado. Passeios.

Carro parado no farol. O menino se aproxima com o papel nas mãos, acho que está vindo em minha direção. Será mesmo apenas um folheto publicitário? E se ele erguer a camisa e sacar uma arma. Não. Melhor não abrir o vidro.

Me desculpe pobre garoto mas não quero seu folheto.

Finjo estar dormindo e ele passa. Entrega o folheto no carro ao lado e volta para calçada.


Medo V


Chega a hora de trabalhar, saio correndo antes que o medo me pegue pelo braço. Passos largos e queixo erguido, com ar de confiança para que todos notem. O toc toc do salto pelas calçadas parece ecoar o bairro todo.
Ando firme, dessa vez ele não vai ser mais forte.

Ao longe avisto um homem. Olho para os lados. Estou sozinha. Finjo falar no celular para que ele pense duas vezes caso esteja pretendendo me abordar. Vou me aproximando. Aproximando. Aproximando...
O toc toc começa a ficar fraco, as pernas não respondem mais. O coração dispara e as mãos que seguravam o celular começam a tremer incontrolavelmente. O ar parece escasso.
Sinto meu rosto frio e pálido, de repente o homem se aproxima. Tudo escurece a meu redor.

Acordo deitada na minha cama e ouço na cozinha alguém dizendo que um bom homem que passava pela rua me trouxe para casa.


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Os dias passam iguais mas o medo não...

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